segunda-feira, 30 de agosto de 2010

ATENÇÃO SENHORES PAIS...

Ligou a televisão e lembrou do tempo em que trabalhava na censura. Quanto trabalho ele tinha para defender a moral e os bons costumes (e podando a indecente criatividade comunista). Aliás, até hoje imagina como os comunistas podiam ser tão inteligentes e astutos. E como se reproduziam rápido. E como escreviam rápido. Que saudades daqueles tempos. As vezes trabalhava até mais tarde, mas valia a pena. Podia mudar o final da novela, matar o bandido do livro na hora que quisesse e até mesmo manter ou revelar mais cedo o autor dos crimes em romances policiais. Teve até o caso do escritor, como era mesmo o nome... Jacinto Barroso. Um escritor de novela policial que de tanto ter a estória de seu livro censurada nem se deu conta que a censura terminou (oficialmente) e até hoje não conseguiu finalizar sua obra. Dizem que morreu tentando lembrar o final que imaginara originalmente.

Hoje, que os comunistas foram praticamente erradicados, sente uma ponta de nostalgia. Os jornais impressos estão muito previsíveis. Rádio quase ninguém ouve e as novelas seguem um modelo antigo de roteiro, em que se sabe o final antes do começo. Mulher pelada aparece em toda parte. De revistas masculinas a fascículos de culinária. Sente falta dos comunistas. Até imagina como seria se recebesse a ração mensal, como em Cuba (que pra ele foi batizada por comunistas, apenas para chocar o resto do mundo. Um país que começa com uma sílaba dessas só pode ser provocação).

Na televisão, normalmente agora nada choca mais ninguém. Só de dois em dois anos as coisas ficam mais animadas. E por pouco tempo. Cerca de dois meses apenas. É quando começa o horário político obrigatório. É muito material para a censura. Infelizmente material que se perde na intolerância, na conveniência e na conivência dos Tribunais. Uma censura mal feita, com uma imparcialidade descabida, que não deixa outra opção ao público senão assistir estas barbaridades e filmecos de roteiro sem inspiração. Cadê o dedo do censor? Quantas cenas absurdas e imorais são permitidas. Quantas traições e relações ruidas são mostradas hoje para no próximo capítulo aparecerem momentos de bajulação explícita entre estes amantes reconciliados. Ah, a censura! Depois de refletir tem certeza de que está faltando uma frase muito importante antes de se iniciar estes programas: ATENÇÃO SENHORES PAIS! TERMINOU O HORÁRIO LIVRE!